Visitar Koyasan e o cemitério Okunoin

Visitar Koyasan e o cemitério Okunoin

Depois de uma noite quase sem dormir, com pessoas a ressonar, a arrumarem malas durante noite e afins, finalmente chegou a minha vez de acordar cedo, e até uns minutos antes do alarme tocar. Fiz a mala e verifiquei se não me esquecia de nada, e lá voltei para a estação de comboios! Chegou a vez de visitar Koyasan, no meio das montanhas!

Como chegar a Koyasan a partir de Nara

Só de olhar para o mapa dá a ideia de que a melhor forma para ir de Koyasan para Nara é em linha recta, mas não é bem assim. Osaka é tipo a “Roma” da zona, a melhor forma de chegar seja onde for na área é passando por Osaka. Então apanhei o comboio JR para Osaka Shin-Imamiya, e dali apanhei outro comboio para Gokurakubashi (a estação no sopé do monte que conecta a Koyasan). O JR Pass não é válido nesta rota, terão de comprar outro bilhete, e vale a pena comprar o bilhete Koyasan World Heritage Ticket, que inclui o comboio, teleférico, autocarro e vários templos e museus. Um bilhete, menos confusão.

Entrada principal do Kondo Hall
Entrada principal do Kondo Hall

O mundo é uma ervilha, e fica ainda mais pequeno quando somos turistas. Por mero acaso voltei a encontrar-me com o Jorge (um couchsurfer que conheci em Hiroshima) na estação de comboios Shin-Imamiya. Estávamos literalmente sentados lado a lado, até que calhei a olhar para quem estava ao meu lado e o reconheci! Obviamente que começámos logo a falar, e passado um pouco um senhor Japonês de mais idade juntou-se à conversa, em inglês claro. O japonês já tinha viajado pela Europa por algumas vezes, e estava mesmo à vontade a falar em inglês, o que foi uma surpresa bem agradável tendo em conta que estava no Japão.

A certa altura durante a viagem, tivemos de mudar para outra parte do comboio. É nesse ponto em que o comboio de montanha começa, em cada estação têm indicação da altitude da estação e das estações imediatamente antes e depois. Tivemos sorte em conhecer aquele senhor, pois ele explicou-nos cada detalhe da viagem até ao topo, foi uma viagem de comboio bem especial!

Explorar Koyasan

Dissemos adeus ao senhor japonês assim que chegámos a Koyasan, o nome dele é Katsumi, e seguimos directamente para o templo para fazer check-in. De uma forma algo engraçada fui ameaçado, as portas fecham às 9 da noite ou então fico na rua. As portas fecham às 9 em ponto, e a maioria dos templos não são flexíveis com o horário, mas alguns até são permissivos. Tendo em conta que estávamos sobre alerta de outro tufão, não seria lá muito boa ideia dormir ao relento…

Complexo de templos Garan

Os edifícios principais do complexo Garan são o Kondo Hall e o Konpon Daito Pagoda, o primeiro é recente, visto que foi queimado algumas vezes nos séculos anteriores, e o segundo foi reconstruído no início dos anos 1930s. Demos umas voltas pela área, mas não entrámos em nenhum templo, no entanto arrependo-me de não ter visitado a Pagoda. De acordo com o que li e me disseram depois, é um dos lugares a visitar! E está incluído no bilhete Koyasan World Heritage Ticket.

Konpon Daito Pagoda
Konpon Daito Pagoda

Tendo em conta que a atrações principal é o cemitério milenar, e que fica mesmo junto à vila, fomos almoçar cedo e seguimos directamente para o cemitério. Logo a seguir ao almoço voltámos a nos encontrar com o Katsumi. Sinceramente, não acho que se tentássemos iríamos encontrar um guia melhor do que ele, uma pessoa bem interessante, cheio de conhecimentos sobre Koyasan e a zona à volta, e acima de tudo com uma paixão a partilhar aquelas histórias todas que nos deixou ainda mais encantados.

Uma paragem em Karukayado

A caminho do cemitério, Katsumi recomendou-nos a visitar este museu sobre a triste história (ou lenda) que aconteceu em Koyasan. Infelizmente encontrei muito pouca informação em inglês sobre a história e sobre o museu.

Para resumir um pouco, conta a história de um pai que nunca soube que tinha um filho, até que o seu filho o foi procurar a Koyasan com a sua mãe. No entanto, na altura, o Monte Koya era um local sagrado e restrito a mulheres, e como ela não estava autorizada a subir o monte, não pode ver nem reconhecer o seu antigo amor, mas o seu filho pode subir.

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Lá ele encontrou-se com o seu pai, que tinha jurado renunciar a sua vida anterior quando entrou no mosteiro, e como tal nunca pode contar ao seu filho quem ele realmente era. Em contrapartida, disse-lhe que o seu pai tinha morrido. O filho desceu o monte para contar as noticias à sua mãe, mas quando lá chegou recebeu ainda mais tristes noticias. Ela tinha adoecido e acabado por falecer. Ele ficou órfão de pai e mãe.

Sem pai nem mãe, ele decidiu entrar no mosteiro, onde ele passou 40 anos da sua vida ao lado do seu pai, sem ter conhecimento disto. Recomendo vivamente uma visita a este lugar, dá para aprender imenso sobre Koyasan. Não sei se esta história é uma lenda ou real, mas é bem conhecida em Koyasan.

Visitar o cemitério Okunoin

É sempre estranho quando digo a alguém que passei uma tarde inteira num cemitério a tirar fotos. Mais estranho é quando digo que viajei para um local remoto principalmente por causa desse mesmo cemitério. Mas sim, isto aconteceu!

O que é que este cemitério tem de tão especial?

Não só é um cemitério com alguns séculos, mas também onde estão enterrados vários lordes feudais japoneses, monges e algumas pessoas menos importantes. Mais mais importante do que isso, neste cemitério está o Templo Okunoin, onde Kobo Daishi descansa, o fundador do Budismo Shingon. E mais uma vez, estou bastante grato por ter conhecido Katsumi, de outra forma só iria ficar a saber sobre estes detalhes mais tarde, e não iria apreciar o local devidamente.

De realçar que disse que é o local onde Kobo Daishi descansa, os monges e outros crentes acreditam que ele não está morte, ele está num estado de meditação eterna à espera do futuro Buda. E para rezar junto dos monges, temos de pagar uma pequena fortuna. Ou então podemos simplesmente rezar mais afastados. É um pouco estranho quando até templos Budistas cobram grandes quantidades de dinheiro por estas coisas, até à data assumia erroneamente que Budismo era uma religião nada materialista. O mesmo no que diz respeito ao alojamento, que foi extremamente caro para o que oferecia. Mas gosto de pensar que paguei pela experiência…

Okunoin Graveyard at night
Okunoin Graveyard at night

Katsumi, o senhor japonês que conhecemos, foi o guia perfeito e a certa altura até senti que partilhava das mesmas opiniões. Ele deu-nos uma experiência bem detalhada e com um pouco de sarcasmo no que diz respeito à religião. Sendo ateu reparei nesse detalhe, e acabei por lhe perguntar a sua opinião. Ele é agnóstico e concorda que cobrar da forma excessiva como fazem é quase como um pecado. Sim, eles precisam de fundos, mas Koyasan é um local bastante turístico e aqueles valores são quase pornográficos.

Acho que podemos “dividir” o cemitério em duas partes, a antiga e a nova. A parte nova mostra muito da cultura empresarial do Japão, que como primeiro impacto é bastante estranho ver várias campas empresariais. No Japão um empregado não é somente um número nos recibos salariais, um empregado é parte de uma grande família que é a empresa, daí as campas. Eles são enterrados como família. Ainda assim, não sei se gostaria de ver um logotipo empresarial na minha campa…

De volta à vila de Koyasan

Quando digo que o cemitério é de facto bem bonito, é porque é mesmo, e não de uma forma bizarra. É um local bem místico que vale bem a pena visitar. Vários guias até recomendam a fazer uma excursão nocturna, o que também tentei… Bem, mas estava na hora de voltar para a vila, e dizer adeus ao Katsumi que ia voltar para casa.

Andámos um pouco para tentar encontrar um restaurante e acabámos por comer num local bem acolhedor. Visto que o Jorge tinha de apagar o último ascensor e comboio para Osaka, apenas fomos dar uma pequena caminhada pelo cemitério depois do pôr-do-sol. Mas a chuva não ajudou muito, além do alerta de tufão para essa noite, então perdi a vontade de andar ali sozinho. E para complicar, vários avisos sobre a possibilidade de nos depararmos com ursos á noite…

Tenho a admitir que foi bem interessante o passeio à noite, no entanto para fotografia nocturna gosto de ter o meu espaço e tempo para aproveitar e sem pressão. Eu detesto sentir a pressão de ter alguém em tédio à minha espera. Como tal apenas fizemos uma pequena caminhada e voltámos para a paragem do autocarro. Depois disso ainda equacionei voltar, mas a chuva já estava mais intensa, então achei que não valia a pena arriscar a esquecer-me da hora de entrada e ainda ficar a dormir ao relento. Como tal regressei.

No templo / hotel

Depois de fazer o check-in, a primeira coisa que reparei foi que o número do meu quarto era o número 4. O que é bastante estranho, tendo em conta a superstição japonesa quanto a este número. Talvez tenha sido por isso que atribuíram este quarto a um europeu… Depois de desfazer a mala, fui relaxar para o onsen, e mais uma vez, bastante desiludido. Onsen está literalmente no nome do templo, Koyasan Onsen Fukuchiin, e foi uma desilusão. O onsen não tinha nada de especial, bastante pequeno, até mais pequeno do que o de Kurashiki, estava a contar com um onsen exterior, mas não… Ainda assim, foi bem relaxante depois de um dia inteiro a caminhar, como tal não reclamo (muito).

Visitar Koyasan e o cemitério Okunoin
Visitar Koyasan e o cemitério Okunoin

Depois do meu banho relaxante, voltei para o meu quarto onde encontrei já o colchão colocado. Mais outro detalhe sobre o templo, não dá para fechar a porta do quarto por fora… Tive de confiar que ninguém iria tirar nada das minhas coisas. Então, depois de ler fui dormir, visto que tinha o meu pequeno-almoço agendado para as 7:30, mais outro dia a madrugar.

Para ser sincero, tinha o objectivo de acordar cedo para ver os monges a rezar, no entanto acabei por voltar para o onsen onde estive bastante tempo. Passeei um pouco pelos jardins, que são bastante bonitos e pequenos, e depois tive de voltar a fazer a mala. Eles foram bastante simpáticos e guardaram-me as coisas por umas horas, então fui passear por Koyasan por mais um bocado antes de voltar para Osaka. E deixar-me perder por Koyasan (onde estavam vários avisos sobre ursos…). Gostei mesmo daquela vila, uma pena que não fiquei por mais tempo…

Últimas horas em Koyasan

O meu plano para o meu último dia em Koyasan? Acordar bem cedo e ir ver os monges a rezar.

O que fiz? Acordei bem cedo (para o meu habitual), e fui para o onsen para a despedida!

Acho que não soube aproveitar devidamente os benefícios de um bom onsen, ou na verdade, acho que apenas experimentei os menos bons. Mas acordar cedo, e ter desfrutar de um bom longo banho relaxante ajudou bastante no meu humor para o resto do dia. Sim, eu estava de férias e num local bem especial, seria estranho não acordar de bom humor. Mas esta forma de acordar é algo que não temos na Europa!

E depois daquela experiência relaxante, tinha já outra ainda mais intensa à minha espera quando voltei para o quarto. Já tinha o quarto preparado para o pequeno-almoço! Sentei-me e aguardei pelo banquete, e que banquete… um pequeno-almoço vegano brutal! Sim, vegano! E sim, brutal! Nem faço ideia do que eram algumas das coisas que comi, outras misturei-as à minha maneira. Mas cada combinação foi como que uma explosão de sabores! Tão bom! E talvez isto até tenha justificado o preço do alojamento…

A desfrutar de um pequeno-almoço vegano em Koyasan
A desfrutar de um pequeno-almoço vegano em Koyasan

Tinha algumas horas até ter de voltar para a “civilização”. Inicialmente tinha planeado um dia inteiro em Koyasan, mas o tempo não estava muito dado a isso. Como tal, caminhei em direcção à floresta, por uma estrada nacional com vários avisos “cuidado com os ursos” ou “não caminhe sozinho“. Não liguei muita importância, como ia pela estrada assumi que não teria muitos riscos, mas a chuva… Fez-me lembrar a Irlanda…

Passei algumas horas perdido, até que decidi voltar para a vila e dar um último passeio antes de apanhar o autocarro e o ascensor e voltar para Osaka. Mais uma vez, pelo mesmo caminho impressionante pelas montanhas, até que tive de trocar de comboios novamente. Acho que nem me cheguei a sentar só para poder aprecisar as vistas.

A caminho de Osaka desde Koyasan

A certa altura, julgo que perto de Nara, não tenho bem a certeza, o comboio já ia algo cheio e um rapaz sentou-se à minha frente. Ele era de certeza um estrangeiro como eu, sorriu para mim ao que eu assumi que me conhecia de algum lado. Então disse olá e isso foi o inicio de uma conversa bem agradável. Ele é Australiano e estava emOsaka para aprender japonês simplesmente porque sim. Também porque ele tinha três meses de férias pagas ao que ele decidiu usar como uma experiência de aprendizagem, que sinceramente acho que é uma ideia fantástica. Mais um amigo viajante, outra pessoa aleatória que conheci enquanto viajava. Tenho a certeza que as probabilidades de conhecer alguém assim são bem mais altas quando viajamos sozinhos. Estamos mais receptivos a conhecer novas pessoas, e não tão fechados no nosso grupo de amigos.

Ao chegar a Osaka entrei no comboio errado. Na verdade, na direcção errada, mas felizmente era uma linha circular, como tal acabei por ir dar ao mesmo sítio sem ter de fazer mudanças. Cheguei cedo demais para poder fazer check-in, como tal deixei as malas e fui dar uma volta.

Onde fica Koyasan?

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Categorizado como Ásia Etiquetas:

Por Gil Sousa

Português emigrado em Cork, viajante e apreciador de boa comida.

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